Repensar a educação ou transformá-la

"Como são aborrecidos os estudos que falam eternamente em “reformas” e “desempenho” — mas não se dão conta de que o modelo iluminista está superado, e já há formas reais de ultrapassá-lo?" Esta é a questão sobre a escola no Brasil abordada por Alexandre Sayad, e que, pelo exposto, nos merece reflexão.

 “Ser” é melhor que “pensar”. Assim como “fazer” vale mais que “pensar”. Sinto um misto de preguiça e frustração quando leio artigos sobre educação clamando para que a velha escola seja repensada – excitados pelas avaliações frustrantes do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - Brasil). Um exercício meramente ególatra.
A escola é repensada continuamente desde que o modelo iluminista, e posteriormente fordista e politécnico, de ensino e currículo se fizeram presente. São toneladas de pesquisas e teorias forjadas na solidão das salas de universidades. O universo da educação formal, e das faculdades de pedagogia, é maioritariamente composto por pensadores e pesquisadores. Pensar e repensar são suas especialidades. Transformar, não. Eis a questão.

Por exemplo, o MEC propôs semana passada para o Ensino Médio algo prosaico em termos de pensamento, mas inovador na prática: um modelo matricial, e não curricular de ensino. Isso significa que as disciplinas se mesclariam estimulando a elaboração de projetos interdisciplinares pelos alunos. Ora, a chamada “pedagogia de projetos” é algo criado por John Dewey no começo do século passado! Colocá-la em prática é a grande novidade – pensá-la, não.


O Schumacher College, em Londres, e a Oregon Episcopal School, nos arredores de Portland (EUA) não têm currículo há muito tempo. Trabalham por projetos e estão entre as instituições mais renomadas e respeitadas do mundo. No Brasil, ignorado pela grande mídia, o tal Ensino Médio Inovador já está presente desde 2009 em mil escolas com Ideb abaixo da média.


Fico menos animado ainda quando percebo que o PNE (Plano Nacional De Educação), algo elementar para a melhora do ensino, está com votação truncada na Câmara e que os sindicatos já chiaram quando souberam da proposta do MEC. Começa a ir por água abaixo uma implementação que poderia, juntamente com outros ajustes, dar uma guinada no Ensino Médio a favor dos que têm mais interesse nele: os estudantes.


Por trilhas alternativas, projetos bem implementados de produção de comunicação por alunos em escolas têm o poder de transformá-las. Esses são realidade em mais de três mil escolas públicas do Brasil – não vi até agora um aferimento de qualidade por parte do MEC ou institutos ou uma reportagem na grande mídia sobre eles.
A última pesquisa que tive notícia, o Aprova Brasil, do Unicef, mostrou que escolas que se aproveitavam do fazer comunicativo obtinham Ideb acima da média porque estimulavam a participação da comunidade nas decisões escolares.


Nesses casos, não se trata de fórmula mágica ou grandes exercícios mentais. Trata-se de aproveitar o que de melhor o estudante faz fora da sala de aula, vídeos e textos com celulares e redes sociais, e colocá-los a favor da aprendizagem. Nesse sentido, uma recente pesquisa nos Estados Unidos surpreendeu: segundo a Child’s Mercy, 83% dos pais entrevistados, apesar dos receios recorrentes das redes sociais, aprovavam seu uso como importante na educação dos filhos.


Repensar a escola não causa impacto algum à educação. Refazê-la, sim; e isso implica em experimentar. Para medir os resultados são necessários anos, talvez gerações, afinal impacto educacional não se mede da noite para o dia. E uma escola experimental pode facilmente ser refutada pelo seu público, em geral conservador e avesso a experimentalismos – mas que adora “repensar” a educação de seus filhos.


A pergunta que fica é: estamos realmente prontos para uma nova escola, na prática?


Alexandre Sayad, Portal Aprendiz (Brasil)

 Imagem: A escola do ano 2000 imaginada pelos ilustradores franceses Jean Marc Coti e Villemard, em 1899